O que veremos no comentário desta semana, é o relato de um dos maiores líderes mencionados pelo texto bíblico, se não for o maior. Moisés assumiu uma grande responsabilidade ao ser orientado por Deus a liderar o povo de Israel pelo deserto do Sinai. Para que isto se tornasse real, o próprio Deus o capacitou inicialmente no convívio na casa de Faraó, recebendo as melhores instruções educacionais da época.
Em um segundo momento, retira-se ao deserto como parte do plano divino, para atravessar com aquele por aquela região de extremos. Todavia, mesmo com toda a capacitação recebida da parte do Senhor, ele precisou receber conselhos do seu sogro Jetro sobre como liderar aquela multidão pela aridez daquela região inóspita, constituindo líderes de grupos que o ajudassem. Uma grande liderança se faz com a colaboração de auxiliares que, ao ser orientados, tornar-se-ão em ferramentas indispensáveis no desempenho do serviço.
I- O TRABALHO DO SENHOR E OS SEUS OBREIROS
1. Despenseiro e não dono (Êx 18.13-27). Por mais capacidade e talentos que este possa ter, isto não o impedirá de falhar em sua liderança. O obreiro não pode tomar conta do rebanho como se este fosse um objeto a ser manipulado à sua própria vontade.
-Diótrefes era um obreiro amante da preeminência. Um obreiro centralizador (3 Jo v. 9). Este é o tipo de líder que imagina que sabe tudo, que ninguém além dele consegue resolver os problemas, executar as tarefas. Seu nome significa "Filho adotivo de Zeus", o que sugere que era de descendência grega.
De acordo com a forma como Paulo se dirige a ele, nota-se que se trata de um obreiro que se enquadra no perfil dos líderes que se consideram proprietários do rebanho do Senhor. É do tipo manipulador, arrogante, pedante e insubmisso. O termo "(...)procura ter entre eles o primado(...)" , revela a personalidade de alguém que sempre quer estar ocupando o primeiro lugar em todas as circunstâncias e a qualquer custo, não importando-se com as consequências.
-Diótrefes, um narcisista. A exemplo de Narciso da mitologia grega, volta-se à própria imagem de modo idolátrico a tal ponto que não consegue enxergar beleza em outro que não nele próprio. Este tipo de obreiro, enquadrando-se no perfil narcisista, ama os holofotes, as câmeras, os olhares focados em sua direção.
Por sua vez, sustenta-se no seu eu, colocando-o acima de Deus e menosprezando os seus companheiros. João Batista, mesmo com um ministérios produtivo e reconhecido pelo povo por ser quem batizava na região, convocando o povo ao arrependimento, sem nenhuma dificuldade reconhece: "É necessário que Ele cresça e que eu diminua (Jo 3.30)".
2. Falta de percepção do líder (Êx 18.14,17). Moisés, como vários líderes que conhecemos em nossos dias, tinha uma agenda lotada de atividades diárias. Atendia durante todo o dia, em uma rotina extenuante, porém sem grandes resultados. Por outro lado, a multidão que precisava do atendimento, cansava-se excessivamente pela exposição diária ao sol e demais intempéries do deserto.
Para quem está do lado de dentro das atividades, nem sempre é fácil perceber pequenos detalhes que fazem diferença no que concerne à qualidade. Jetro, por ter um olhar de fora para dentro do arraiá, consegue notar as fragilidades da liderança de Moisés.
(a) não consegue ver que o povo se cansa enquanto o espera. O líder experiente precisa reconhecer os limites do povo. Por vezes, o obreiro não consegue atingir o alvo simplesmente porque o povo não tem mais condição de dar uma resposta imediata por estar cansado "(...) e todo o povo está em pé diante de ti, desde a manhã até a tarde? (Êx. 18.14b)";
(b) Moisés sentia-se insubstituível "(...)é porque este povo vem a mim para consultar a Deus (Êx 18. 15)". Este tipo de percepção é muito danoso ao serviço cristão, pois atrofia o trabalho, revelando falta de segurança e de maturidade do obreiro. Um dos possíveis motivos para semelhante comportamento, é o receio de que o substituto tome-lhe o lugar. Na verdade, no serviço cristão, ninguém ocupa o espaço de ninguém, pois cada um faz aquilo para o qual o Mestre o chamou;
(c) o próprio cansaço torna-se em obstáculo para o avanço da obra (Êx 18.14). Mesmo tendo ao seu lado pessoas capazes para o ajudar, encara o trabalho sozinho, já cansado e por conta disso, com pouca produtividade "(...) Que é isto que fazes ao povo? Porque te assentas só, e todo o povo está adiante de ti (...)".
3. O líder necessita de ajudantes (Êx 18.18). Como já foi dito anteriormente, ninguém pode se colocar como ser insubstituível. Quando for necessário, Deus o retira do seu posto e põe outro que fará até melhor que você. O que jamais Ele irá aceitar é que em nome do egoísmo do homem, a obra sofra dano de continuidade.
(a) Quando o líder reparte tarefas, ele demonstra seu poder de visão à longo alcance. A esta falta de visão se deve o fracasso de muitas Igrejas. Muitos, a exemplo do porco que só consegue olhar para baixo, se contentam com o pouco que conseguem enxergar. São obreiros com uma mentalidade medíocre, míope e mesquinha, incapazes de sequer ouvir a opinião de um membro, por achar que este não entende nada do serviço cristão. Geralmente têm receio dos chamados "pensadores", por imaginar que representam uma ameaça, pelo fato de questionarem e demonstrarem que realmente sabem do que estão falando;
(b) neste repartir de tarefas, é possível treinar/preparar novos obreiros para os desafios da seara. O líder que de fato se preocupa com o progresso do seu ministério, ocupa-se em capacitar pessoas competentes para darem continuidade àquilo que iniciou. Jesus preparou seus discípulos com tamanha segurança que chegou a afirmar: "(...) fareis coisas maiores do eu".
II OS AUXILIARES DE MOISÉS NO MINISTÉRIO.
1. Deus levanta auxiliares (Êx 18.21). Paulo, em seu ministério contou com a ajuda de auxiliares, colaboradores e cooperadores. Sem estes, certamente o grande apóstolo dos gentios não teria alcançado toda a Ásia naqueles dias, dentro do espaço de tempo que conseguiu e com a abrangência com que o trabalho missionário foi realizado (Rm 16. 3,21;). "Quanto a Tito, é meu companheiro, e cooperador para convosco; quanto a nossos irmãos, são embaixadores das igrejas e glória de Cristo 2 Co 8. 23)".
No ato da criação, Deus revela-nos como pensa e age quando o assunto é trabalho. "Façamos o homem, à nossa imagem, conforme a nossa semelhança". De igual modo, Jesus teve seus auxiliares durante o ministério terreno e foram estes que após a sua morte, deram prosseguimento, mesmo em meio a todo o sofrimento, à proclamação do Evangelho como meio único de salvação para os pecadores.
2. Os auxiliares de Moisés (Êx 18.25). Notemos que diferentemente do hoje acontece, as pessoas escolhidas para auxilar Moisés, são pessoas que com suas qualidades correspondem ao que naquele momento julgou-se necessário para o desempenho das atividades.
Vejamos que Miriã era cantora e profetisa; Arão serviu como porta-voz e líder dos sacerdotes; Jetro, mesmo não sendo judeu, demonstrou ter noções de administração e foi muito útil a Moisés; Josué, um grande general obediente e fiel, substituiu o seu líder exercendo um excelente papel como comandante do grande povo, a partir do Jordão até a entrada em Canaã.
Segundo BOICE (2011, p. 546), ao comentar Atos 6.1-6 que trata da escolha dos sete diáconos, aparecem pelo menso quatro princípios relevantes para esta separação. Primeiro, deve haver uma divisão de responsabilidades. Os apóstolos perceberam que não teriam como dar conta do ensino, da oração e ao mesmo tempo socorrer aos necessitados de maneira que "(...) houve uma murmuração entre os gregos contra os hebreus, porque as suas viúvas eram desprezadas no ministério cotidiano (At 6.1)".
Em segundo lugar, deve haver uma pluralidade de liderança. "(...) esclhei, pois, irmãos, dentre vós, sete varões de boa reputação... (At 6.3). Obviamente, Deus em sua sabedoria sabe que quanto maior é o grupo envolvido em prol de uma causa, maior a probabilidade de sua execução exitosa, pois cada componente assume determinada área do serviço, evitando a ociosidade de uns e o cansaço excessivo de outros, além de evitar princípios de ciumeira entre os membros. Ou seja, não eram todos fazendo a mesma coisa, mas todos estavam fazendo alguma coisa, e tudo com a visão do crescimento do Reino de Deus.
Terceiro, há uma preocupação com a qualificação espiritual. "(...) sete varões de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria, aos quais constituamos sobre este importante negócio (At 6.3). Vejamos que não é levado em conta o grau acadêmico, o status social, ou mesmo o poder aquisitivo dos candidatos, nem mesmo a influência dos candidatos. Outrossim, o que foi decisivo foi a conduta, ou seja, o caráter destes.
Fica evidente no texto que qualificações espirituais tem muito mais a ver com as relações externas do que propriamente com as questões internas do ser, como erradamente pensam alguns neófitos, que relacionam vida espiritual exclusivamente a uma vida de oração, jejum e culto, como se apenas isto fosse suficiente, omitindo-se das demais coisas. Não que isso não seja bom.
Temos o dever de fazer todas essas coisas que fazem parte da rotina cristã, e é saudável. Mas, lembremos da orientação dada por Cristo de que devemos vigiar. E isto inclui o cuidado constante que precisamos ter em todas as áreas de nossa vida.
Do contrário, essas pessoas poderão agir de modo semelhante a determinado grupo bem conhecido, que pula o carnaval, bebe, praticam relações sexuais ilícitas à vontade e acreditam que são justificados na quarta feira de cinzas. Alguns do nosso meio (inclusive obreiros), de igual modo, aprontam todas durante o dia e pensam que porque falam línguas estranhas no culto à noite, tudo está resolvido. Quanto engano!
Quarto, os líderes devem ser eleitos pelo povo a quem eles servem. "Escolhei, pois, irmãos, dentre vós... (At 6. 3). A plenária aqui teve seu reconhecimento por parte dos apóstolos. Estes, sabiamente não quiseram tomar esta decisão complexa de forma arbitrária. Antes, permitiram que o povo revelasse seus anseios e pensamentos.
É pertinente que se ressalte que a plenária também quer ser ouvida nas decisões importantes a respeito de seu funcionamento. Há muitos que por se conceber como extremamente capacitados, agem como se apenas coubesse ao povo ouvi-los em lugar de ser ouvido. Moisés, mesmo diante de toda a sua bagagem espiritual e experiencial com Deus, teve a ombridade de escutar uma pessoa que sequer fazia parte do povo judeu.
Em nossos dias, a Igreja tem sido castrada neste particular. Haja vista a maneira como são feitas as consagrações e a forma como é conduzida a mudança dos líderes, bem como o formato em que são empossados nas Igrejas. A plenária só tem conhecimento das decisões previamente tomadas, sem participar em nenhum momento das discussões, restando apenas afirmar se concorda ou não, - o famoso "balançar de cabeça".
É assustador sabermos que boa parte dos homens que são consagrados hoje ao ministério, o são por conveniência dos pastores, que precisam de um grupo de subalternos, alienados e com pouquíssima capacidade de contrariá-los em suas decisões sórdidas, egoístas e prepotentes.
III QUALIDADES DE MOISÉS COMO LÍDER
1. Mansidão e humildade (Nm 12.3).
a) Moisés, homem manso. "E era o homem Moisés mui manso, mais do que todos os homens que havia sobre a terra". Ser manso é uma das características exigidas para quem se dispõe a fazer a obra de Deus. O obreiro que não possui esta mansidão, finda por bloquear o contato com seus liderados. A pior coisa que pode acontecer a um líder, é o povo ter medo de procurá-lo para expor suas preocupações. Quem poderá ajudar este povo? É neste momento que muitos vão buscar ajuda fora dos limites da Igreja, o que é grave.
b) Moisés, um líder humilde. (1) O termo humildade aparece 11 vezes na versão ARC em português. A palavra gr. tapeinophorosyne é usada outras seis vezes e traduzida na versão KJV em inglês como "humildade" de pensamento (Fp 2.3; Ef 4.2) e como "humildade" (At 20.19; Col 2.18,23; 1 Pe 5.5). (2) Uma característica cristã, resumida em Romanos 12.3 "Porque... digo a cada um dentre vós que não saiba mais do que convém saber".
A humildade é uma atitude mental de inferioridade, é aquela capacidade dada pelo Espírito Santo que permite ao cristão reconhecer que tudo o que ele tem e é, na realidade são de dados por Deus, em razão de sua misericórdia e não como merecimento ou por capacidade de quem o recebe.
Trata-se de uma submissão voluntária, incondicional e individual do crente em Jesus Cristo. Não confundamos esta ação como ato de humilhação ou subserviência. O servo de Deus pode e deve ser sincero em suas opiniões, sem no entanto deixar de ser humilde. Tenhamos o cuidado para não confundir MASOQUISMO CRISTÃO com humildade.
2. Piedoso e obediente.
a) Moisés, um homem piedoso. O termo grego eusebeia , em sentido amplo significa praticar a piedade. Por sua vez, a piedade é uma característica determinante daquele que está em Cristo (Rm 12.1). A realização prática da piedade na viada dos fiéis, se dá por meio do exercício da justiça, a fé, o amor, a paciência e a mansidão, conforme 1Tm 6.11 "Mas tu, ó homem de Deus, foge destas coisas, e segue a justiça, a piedade, a fé, o amor, a paciência, a mansidão". e 1Pe 1.5-7 "E vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência, acrescentai à vossa fé a virtude, e à virtude a ciência, e à ciência a temperança, e à temperança a paciência, e à paciência a piedade, e à piedade o amor fraternal, e ao amor fraternal a caridade PFEIFFER, (2010, p. 1534)".
b) Moisés, um homem obediente. Segundo PFEIFFER, (2010, p. 1533)". As palavras hebraicas e gergas traduzidas coo "obedecer" ou "obediência" são geralmente 'shama' e as formas cognatas 'arouo' , onde o significado básico de ambas é "ouvir". Ainda que a obediência esteja muito associada as relações humanas, sua referência mais significativa implica na relação entre o homem e Deus, enquanto criador. Ainda abordando a respeito da obediência, (Pfeiffer, 2010, p. 1385) afirma se tratar do mais alto nível, em se tratando da noção de fazer a vontade de Deus, por parte dos que o servem.
O mais alto nível de obediência para o cristão é fazer a vontade de Deus de todo o coração (Rm 6.17), e não por uma mera complacência exterior. Ele possui um espírito de obediência que cria dentro de si o desejo de obedecer no pensamento e através de atitudes (por exemplo, Mt 5.28,44; 19. 21,22). O cristão tem amente de Cristo (Fp 2.5), pois a Palavra de Deus está dentro de seu coração e ele deleita-se em fazer a vontade de Deus (Sl 40.8; cf. Hb 10. 5-9).
Não raras vezes deparamo-nos com psêudos ensinadores nos púlpitos, associando inadequadamente esse termo, sugerindo uma obediência à todo custo ao homem, em nome de Deus. Mas vale reforçar que além das características acima mencionadas, a Bíblia aponta outros aspectos da obediência.
Em primeiro lugar, o obedecer deve estar enquadrado no princípio da racionalidade, conforme encontramos na carta de Paulo aos Romanos. "ROGO-VOS, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional (Rm 12.1).
Em segundo lugar, o obedecer deve estar dentro do princípio da voluntariedade. O cristão só deve obedecer se o seu coração o constrange a isto, "Porque o amor de Cristo nos constrange, julgando nós assim: que, se um morreu por todos, logo todos morreram 2 Co 5.14 (Bíblia Digital)."
3. Fiel (Nm 12.7; Hb 3.2,5). Deus deu testemunho de Moisés, por sua fidelidade "E, na verdade, Moisés foi fiel em toda a sua casa, como servo, para testemunho das coisas que se haviam de anunciar". De igual modo, não podemos nos negar a uma vida de fidelidade, serviço e temor a Deus.
Ele permanece o mesmo e espera de cada um dos que o servem que assim o façam, em comprovação da transformação operada por cristo em suas vidas. A fé do cristão só pode ser evidenciada por intermédio de uma vida prática de fé, boa conduta, fidelidade e amor constantes.
Por fim, considerando o que até aqui foi exposto, percebemos que nenhuma liderança poderá ser profícua, se esta não tiver ao seu lado pessoas qualificadas em quem possa confiar e delegar atribuições. Todo cristão de modo espontâneo, precisa compreender que temos tarefas a executar dentro do contexto do serviço do Reino.
Além do mais, para que nos tornemos auxiliares, cooperadores e colaboradores na obra de Deus, é imprescindível que tenhamos uma vida de humildade, obediência, fidelidade e amor pelo próximo, seguido de um testemunho inquestionável perante a sociedade na qual estamos inseridos.
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Referências bibliográficas
BÍBLIA SAGRADA. VERSÃO DIGITAL 6.7.
BOICE, James M. Fundamentos da fé cristã – Um manual de teologia ao alcance de todos. Central Gospel: Rio de janeiro, 2011.
Bíblia de Estudo Pentecostal. Antigo e Novo Testamento. Versão revista e corrigida. Rio de Janeiro: CPAD, 1995.
PFEIFFER, Charles F; VOZ, Howard F.; REA, John. Dicionário bíblico Wycliffe. CPAD: Rio de Janeiro, 2010.
GILBERTO, Antonio. Moisé, sua liderança e seus auxiliares. In: Lições bíblicas para a Escola Dominical. 1º trimestre de 2014. CPAD: Rio de Janeiro, 2014.
1º Trimestre/2014 - Lição 8.
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